terça-feira, 9 de agosto de 2011

Res: [STBSEB:6439] Dupla Predestinação, o Barro "decaído" e a Arbitrariedade de Deus

Oi Pastor, escrevendo do meu telefone, bem simploriamente digo que respeito tudo e todos como pensam, todavia discordo que Deus é santo, justo, perfeito, sábio, Todo-Poderoso como o irmao afirmou tratando a sua criação assim, ou seja, pra mim o principio de Soberania fere o principio de justiça, dai falar em arbitrariedade, desconheço sem regras pré definidas, portanto, sou do tipo que crê que não sabemos nada, mas em Jesus de Nazare vejo que ele amou e morreu por TODOS, inconcebível ver expiação para alguns.

Fraterno Abraço!

Fabio Mangea
posso dizer que se for como

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Date: Tue, 9 Aug 2011 22:15:33 -0300
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Subject: [STBSEB:6436] Dupla Predestinação, o Barro "decaí do" e a Arbitrariedade de Deus


Dupla Predestinação, o Barro "decaído" e a Arbitrariedade de Deus



Por Jorge Fernandes Isah

A partir do livro Eleitos de Deus, de R. C. Sproul, farei algumas considerações sobre a sua abordagem relacionada à dupla predestinação, o barro "decaído" e a arbitrariedade de Deus. Boa parte desses argumentos podem ser lidos nos meus comentários ao livro, disponíveis aqui.

Ressalto ainda que o meu intento não é o de polemizar pelo simples gosto da polêmica, mas revelar os meus pensamentos e fazer com que tanto eu como o leitor pensemos a partir do próprio texto bíblico. Não estou a sugerir nenhuma "saida" das Escrituras, nem uma tentativa estúpida de explicar algo inexplicável. Ao meu ver, o que tem feito os crentes permanecerem vulneráveis ao mundo e a si mesmos [em suas pressuposições] é exatamente o medo de ver na Bíblia aquilo que ali está revelado. Sem fazer-me dono da verdade ou especulador, nem exaustivo no que me proponho: uma reflexão a partir de considerações escriturísticas; o que pode levar muitos ao estudo sério de algumas questões que nem mesmo cogitamos pensar. O que acabará por nos tornar em replicantes de um esquema intruso à Bíblia, reverberando o deleite que o homem tem de ouvir sua própria voz. Então, sem mais delongas, mãos-à-obra!

Na questão da dupla predestinação, ainda que Sproul tente amenizar a eleição dos réprobos, ao dizer simplesmente que Deus escolheu os eleitos e deixou de lado ou à própria sorte os réprobos, não neutraliza a idéia do favor divino, da sua escolha dos eleitos para a salvação; e o desfavor, mas ainda assim uma escolha, dos ímpios para a perdição.

Da mesma forma, dizer que Deus não endurece efetivamente o coração ímpio, mas retira a restrição do pecado sobre eles, deixando-os livres para pecar, é muito simplória e faz o malabarista derrubar todos os pratos no chão e estatelar-se sobre eles, além de não haver respaldo bíblico para essa conjectura.

Usar termos como "endurecimento passivo", "entregá-los ao pecado", "decreto positivo e negativo", "destinação não simultânea", etc, são eufemismos, com o objetivo de suavizar aquilo que Deus empregou objetivamente como sua revelação. Ainda assim, por mais que se tente enfraquecê-los, eles não excluem de Deus o desejo de que seus corações sejam endurecidos, os pecadores se voltem mais e mais ao pecado, e de que destinando alguns para a salvação, estará destinando os demais para a condenação. É fato que Deus não os quis salvar; é fato que ele quis condená-los. Então, por que a necessidade de se tentar "aliviar" Deus quando Ele claramente diz o que fez e por quê fez? Não seria uma forma de subestimá-lo, e de até mesmo considerá-lo imperfeito, um "pobre-coitado" que necessita de nossos artifícios toscos e e imprecisos para defendê-lo do que não quer e nem precisa se defender? Necessitando que o adequemos aos nossos defeitos para assegurar-lhe a perfeição? Isso cheira mal, algo muito próximo da rebeldia ou, na melhor das hipóteses, ignorância disfarçada de piedade. Em muitos casos é não querer aceitá-lo como é; em outros é a incapacidade de vê-lo como se revelou-se a nós.

Sproul chegou ao ponto de utilizar a passagem de Ex 7.2-5 [quando Deus afirmou a Moíses que endureceria o coração do Faraó] como um exemplo de endurecimento passivo, onde Deus não interviu diretamente no coração do Faraó, mas ao remover a sua restrição sobre ele, deixou que "as inclinações malignas de Faraó fizessem o restante"[1]. Ao que pergunto: se isso não é o mais escancarado malabarismo argumentativo a fim de tirar de Deus o poder de mover a vontade do Faraó a fim de que se cumprissem exatamente os seus desígnios eternos, o que mais pode ser? De certa forma, não passa de uma tentativa ilusória para transformar o irreal em verdade através de hábeis jogos semânticos.

Passiva ou ativamente, o Faraó não cumpriu o decreto divino? Tal qual ele foi estabelecido na eternidade? E, ainda que passivamente [especulativo], estaria-se a dizer que Deus obteve o resultado desejado sem querer produzi-lo? E se Ele não quis produzi-lo, quem o produziu? Nós? Há uma nítida inversão de papeis e de valores; sempre como uma justificativa para eximi-lo de uma suposta culpa, o que redundará em uma tentativa, mesmo inconsciente, de desprezá-lo e a sua santidade, sabedoria e perfeição. Antes, deveríamos agir como Jó, que mesmo reconhecendo que Deus pode tomar aquilo que deu, não pecou, nem atribuiu a Deus falta alguma, mas bendizeu o nome do Senhor [Jó 1.21-22]. É a pergunta-resposta que ele profere à sua esposa, que o incitava a blasfemar contra Deus: "Como fala qualquer doida, falas tu; receberemos o bem de Deus, e não receberíamos o mal?" [Jó 2.10]. Esta deve ser a atitude de um servo diante do seu Senhor, ao invés de se buscar formas sofisticadas de murmuração e distorção da verdade.

Da mesma forma, ao referir-se a Rm 9, Sproul diz: "Soa como se Deus estivesse ativamenbte fazendo pessoas ser pecadoras. Mas isso não é requerido pelo texto... veremos que o barro com o qual o oleiro trabalha é barro 'decaído'. Um pouco de barro recebe misericórdia para tornar-se vaso de honra. Essa misericórdia pressupõe um vaso que já está culpado. Da mesma maneira, Deus precisa 'tolerar' os vasos de ira, próprios para a destruição, pois eles são vasos de ira, culpados"[2].

Não sei quanto a você, mas me parece outro contorcionismo desnecessário para não concluir o que o texto bíblico evidentemente afirma: Deus é quem faz os vasos de honra e os vasos de ira, lançando "as riquezas da sua glória nos vasos de misericórdia, que para glória já dantes preparou" [v.23]; assim como a "sua ira, e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita paciência os vasos da ira, preparados para a perdição"[v.22].

Quem preparou? Quem destinou? Quem é o oleiro? Ou seja, quem fez os vasos destinando-os a ser o que são? Se não foi Deus, quem foi? Outro deus? Satanás? O homem? Mas se mesmo o mal, e apenas o mal e o pecado, não foi criado e ordenado à existência pelo Senhor, Ele não é soberano, e estamos de alguma forma enganados ou sendo enganados. Se como a Bíblia assegura que não há outro deus além do Senhor, e de que Ele é o criador de todas as coisas, por que ainda resistimos? Por que não nos sujeitamos às evidências internas das Escrituras? Certamente porque os nossos conceitos e argumentos não se encontram em unidade e harmonia com essas manifestações certeiras; os quais penetram sorrateiramente pela porta dos fundos, como se fizessem parte da revelação proposicional quando não passam de parasitas a provocar a verdade, no exercício de induzir o crente a uma aventura desastrosa, a culminar numa imagem distorcida de Deus.

O barro não existia previamente antes de Deus fazê-lo existir. O barro "decaído" não decaiu alheio à vontade de Deus, à sua revelia, por vontade própria. O barro "decaído" não foi autocriado, ou criado por outra "força". O barro "decaído" surgiu pelo poder e vontade de Deus, e apenas por Ele poderia existir. O mesmo poder que destinou alguns para a glória e outros para a perdição. Ou seria possível ao homem escolher a forma como Deus o faria? E de como sería? Por exemplo, a cor dos olhos, cabelos ou pele? E o que dizer de coisas como o estado pecaminoso e o redentivo? Afinal, qual poder temos sobre nós mesmos? E a história? E a eternidade?

Fico com a impressão de que o autor quer ao mesmo tempo dizer e não dizer o que diz. E suas atenuações acabam por enfraquecer e confundir o conceito de soberania, predestinação e eleição divinas.

Isso é manipulação teológica, com todo o respeito e admiração que o Dr. Sproul merece. Bastaria ater-se ao texto bíblico, que é claro e límpido como água [especialmente os dois textos citados], sem a preocupação de imputar a Deus qualquer injustiça, pois, o menor pensamento de que isso seja possível somente poderá vir de uma mente doentia e caída; de uma mente não regenerada e carente da misericórdia divina. Nesses casos, vale a mesma resposta dada por Paulo: "Mas, ó homem, quem és tu, que a Deus replicas? Porventura a coisa formada dirá ao que a formou: Por que me fizeste assim?"[Rm 9.20].

Outra questão é a definição de arbitrário. Ele afirmou que Deus não é arbitrário, porque "por si só, ser arbritário é fazer alguma coisa por nenhuma razão"[3]. Bem, acho que esse conceito do autor, demonstra o seu nível de excentricidade, ou seria arbitrariedade?

A palavra arbitrário designa alguém que decide como árbitro, que não é regulado por leis, mas só depende da sua vontade. Nesse sentido, Deus é completamente arbitrário. Há algo igual ou superior a Ele, ao qual esteja condicionado? Deus faz exatamente tudo aquilo que quer, como quer e da maneira que quer, segundo a sua perfeição, santidade e justiça. E quem somos nós para questioná-lo? Ou para moldá-lo a um padrão humano?

Não nascemos por nossa vontade, nem escolhemos o país, os pais, sexo ou nível de inteligência que gostaríamos de ter. Nascemos pecadores sem desejar sê-lo; somos eleitos sem querer sê-lo; e muitos irão para o inferno sem querer ir. Essas coisas todas aconteceram e acontecerão à nossa revelia, pela arbitrária vontade divina. Então, considero Deus arbitrário no sentido de que tudo no universo acontecerá segundo o seu arbítrio, sem nenhuma consulta prévia, sem nem mesmo Ele se preocupar se suas decisões agradarão ou não à sua criação. E, por que? Porque ele é santo, justo, perfeito, sábio, Todo-Poderoso. E porque somos pecadores, injustos, imperfeitos e tolos, criaturas metidas a besta, julgando ter algum poder quando não temos nada, e o pouco que temos [o que é muito para a nossa condição] provém dele, e é por ele, para a sua glória.

Descrever a vontade divina como não-imperativa, não-absoluta, em que o governo de Deus não depende exclusivamente de si, nem é independente do universo governado, é professar a maior heresia que o homem é capaz de produzir. Numa tentativa tola de diminuí-lo aos nossos olhos. Portanto, concluo que Deus é arbitrário, e não há como não ser. Em qualquer situação que se vá explicar a soberania divina, não há como não ligá-la à arbitrariedade. Senão não estaríamos falando de Deus, mas de deus, algo diminutivo, depreciativo, frágil como nós.

Nos aspectos citados, a despeito de muita coisa valorosa e pautada biblicamente que o Dr. Sproul diz e escreve, não posso concordar com suas afirmações. Elas me parecem como o marido desesperado que, ao encontrar a esposa em adultério no sofá da casa, joga fora o sofá.

Notas: 1 - Eleitos de Deus - R. C. Sproul - Editora Cultura Cristã - página 109;
2 - Idem - página 114;
3 - Ibidem - página 116;
* Texto publicado originalmente em 05.02.2010, aqui mesmo, ao qual fiz pequenos ajustes.


Fonte: KÁLAMOS


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